sábado, 30 de julho de 2011

O meio





Só quem vira brisa sabe o que chora o vento
Eu quero ser para o redemoinho o sopro
Suspiro que acorda Vênus
E na tua boca um ar de riso
Mas não me venha com receio
Nem peça para eu ir com calma
Eu sou uma violenta agitação de ar
Acompanhada quase sempre de chuva
Amor na minha idéia se retrata
Ou o cupido solta-me de vez dos teus braços
Ou faz de nós dois um só semblante
Nasceste de um acaso não pensado
E cresceu-te um olhar pouco advertido
Mas não me venha com receio
Nem peça para eu ir com calma
Que do meu peito sai água destilada
E deixais ser, levais ela mudada
Eu deixo o passado como quem deixa o tédio
O amor é agridoce, amado!
E não me venha com a ilusão de que tudo é leve
Pois é insustentável a leveza do ser

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Noite sem lua ou a vida nos botequins

Percorro as noites longas do inverno. O preto cintila o desassossego, aquele contraste do azul. A sua mão morna que segura o meu seio, não mede meu peito. Toda linha que separa o caos ao sereno azul, do preto ao intenso azul, me insere a esses tons, por ali me arrasto até somar a cor, uma sensação de vida parecida com essa estação. Gosto de sentir-me nessas horas lentas das noites extensas do inverno, sobe-me algo lírico da alma e se destaca, drama acompanhado de canto.




O que deixava a moça despreocupada era saber que na vida podia vestir a pele de uma personagem de romance. O ridículo foi seu papel extraído de má literatura. No outro dia a estrada de sua vida era traçada pelos seus olhos que brilhavam como de costume. Havia acabado de aceitar tudo isso, pois sabia como ninguém se transformar nessa personagem, que se insinuava sobre sua pele, depois de devorar palavras de Machado de Assis. Ela, que nunca temia pelo dia seguinte, sentia-se numa vida sem pudor, ela conseguia se libertar inteiramente do dia anterior. Gostava de sua honra paradoxal, a sombra e a luz, o colorido e as posições das figuras.

Palavras Brancas




Tornou-se difícil diluir em palavras os sonhos. No fundo é isso o que me dói um pouco. Não viver provoca dor. Morrer é outra coisa. E não há porque sofrer por não ser uma coisa ou por sê-la. Apesar de tudo escrevo palavras brancas, até sentir sobre os ombros um peso leve, os cabelos e algumas mãos. A tortura de uma mulher forte é maior que a de um doente, cuja profundidade é impossível de avaliar. É certo que lhe aconteça coisas que vem de fora. E não é só vida que corre em seu corpo. É palavras prenhes flamejantes, sustentadas em carne e sangue. Meus versos já nascem com fome.